Vivemos em uma era em que o silêncio é cada vez mais raro e o estar só parece quase um delito emocional. Somos condicionados a preencher todos os espaços — com vozes, notificações, relações e expectativas — como se o vazio fosse um abismo a ser temido. No entanto, há uma sabedoria antiga escondida na solidão, uma forma de reencontro que só se revela quando a presença do outro se dissolve e resta apenas o eco de nós mesmos.
Estar só não é sinônimo de carência, mas de clareza. É o momento em que o ruído do mundo se cala e podemos finalmente ouvir o que sempre esteve ali: nossas próprias intenções, desejos e limites. Nesse espaço íntimo, aprendemos a diferenciar o que é verdadeiramente nosso do que é reflexo alheio.
A solidão pode ferir no início, mas também cura. É nela que descobrimos a profundidade do ser, a força da introspecção e o poder criativo que surge quando não há plateia. Este texto é um convite para revisitar esse estado com novos olhos — não como uma condenação, mas como uma chance de reconexão com o que há de mais humano em nós.

Não cabemos em nós mesmos, é preciso dividir. Surge alguém que se assemelha de alguma maneira à ilusão de par perfeito que inventamos para nós mesmos. Dividimos. Multiplicamos. Até que o ciclo se encerra. Houve o instante em que tudo parecia afável do ponto de vista coexistencial, porém, como em tudo que é humano, não haveria razão de ser se não trouxesse dor e angústia ao peito, não é mesmo? Não seria justo, não seria real, não valeria as duras penas, não seria, afinal, humano.
A solidão, talvez a maior das dores psicológicas do homem moderno, cativa artistas da palavra há muitos séculos. A busca por sua cura por vezes tange a aceitação de sua inerência à natureza individual do ser humano, ainda que sejamos criaturas sociais. Já dizia Charles Bukowski, “os maiores homens são os mais solitários”. Será, então, que a própria solidão não pode curar algumas dores?
A dor inicial da solidão, o vazio deixado pela ausência do outro, pode ser o catalisador para uma jornada interior. É no silêncio que nos despimos das expectativas alheias e nos confrontamos com nossa própria essência. A solidão, nesse sentido, não é um fim, mas um meio. Um caminho para o autoconhecimento e para a redescoberta de si mesmo, longe dos ruídos e das distrações do mundo exterior.
A solidão traz, em seu análogo poético – a solitude – uma das mais sábias alternativas à sensação punitiva que ela carrega. O estado de solitude permite que exista criatividade, conforto em estar só, evolução e aprendizado. É preciso aprender a ser só, assim como aprender a só ser. O estado de individualidade, tão pouco poetizado, é a única zona de conforto real. Em “O Labirinto da Solidão”, Octavio Paz declara:
“A solitude é o fato mais profundo da condição humana. A natureza humana – se é que esta palavra pode ser usada em referência aos humanos, que se inventaram ao negar a natureza – consiste na busca por realizar-se no outro. O ser humano é nostalgia e busca por comunhão. Portanto, quando se percebe como indivíduo, ele percebe a ausência do outro, ou seja, percebe sua solitude”.
Lancemos, então, um novo olhar sobre o estar só. Não há sentimento ruim no afeto, há o desconforto por querermos nos manter na inércia do prazer e do conforto estático de estarmos acompanhados. Porém, é no momento em que nos deparamos com o horizonte infinito da solidão que consolidamos tudo o que aprendemos com o que passou, estabelecemos o que queremos para uma próxima investida no mundo dos apaixonados e o que não aceitaremos mais. Afinal, até mesmo Jean-Paul Sartre, em sua inexorável liberdade, uma vez disse: “Se sentes solidão quando a sós, estás em má companhia”.

Um brinde ao estar-se preso por vontade a nós mesmos!
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